sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Noregs Vaapen (Taake, 2011)


É engraçada essa conversa sobre "maturidade musical" de uma banda. Num mundo onde os trabalhos mais reverenciados de um grupo geralmente são os primeiros, é muito natural ver esse termo ser jogado para se justificar uma total covardia intelectual de uma banda, fazendo essa covardia ser vista como uma espécie de evolução. Quando eu digo "covardia", eu me refiro ao fato da banda não estar maturando de verdade, e sim apenas misturando elementos que fizeram as pessoas notarem ela primeiramente, com conceitos novos, geralmente medíocres, com o intuito de agregar uma nova parcela a sua base de fãs.

O que me leva ao novo álbum do Taake, "Noregs Vaapen". Primeiro é necessário lembrar que a banda, apesar de contar apoio de diversos musicos, é projeto de uma mente principal, o vocalista Hoest. O primeiro, de 1999, "Nattestid Ser Porten Vid", já mostrava a grande inspiração no black metal com influencia folk, certamente calcado no caminho iniciado pelo Ulver no inicio dos anos 90 ( e poderia ser facilmente acusado de ser clone de algum trabalho inicial desta), com pequenas injeções de thrash metal. Os dois álbuns seguintes, "Over Bjoergvin Graater Himmerik", de 2002, e o grande "Hordalands Doedskvad", de 2005, já mostravam uma intromissão muito maior e mais bem definida dos elementos de thrash, fazendo essas duas obras soarem muito semelhantes ao som que o Immortal fazia na metade da carreira, como "Sons Of Northern Darkness" e "At The Heart Of The Winter".

É aí que entra o álbum homônimo, de 2008. Contrariando totalmente a lógica seguida até então, Hoest decide voltar 15 anos no tempo, e faz um disco que se inclina muito mais ao black metal tradicional norueguês dos medalhões do gênero. Há um maior enfoque nos riffs mais "frios" em oposição às passagens "orgulhosas" e épicas usadas até então. Mas, aparentemente, isso tudo é porque "Taake" faz parte de uma nova trilogia, e pensando dessa forma, "Noregs Vaapen" faz perfeito sentido. Por quê?

Neste LP, vemos um Taake... (preparados?)... mais maduro, mas no sentido do termo que eu acho muito mais intelectualmente honesto, já que é a banda experimentando novas sonoridades, e utilizando características do som antigo apenas para evoluir a composição de um ponto ao outro. O som mais tradicional é misturado a uma tendência mais relacionada ao black metal "ambiente", com riffs mais repetitivos, porém bem construídos, que vão e voltam durante a musica. Isso é facilmente observável durante a faixa de abertura, "Fra vadested til vaandesmed", cujo riff principal constitui a maior parte da musica. O álbum vai constantemente crescendo e mostrando novas influências. As melodias são bem mais melancólicas do que de costume, lembrando bastante o tipo de black metal feito na Finlândia, por bandas como Arckanum e Sergeist, hipnóticas e com uma natureza predominantemente romântica. As passagens mais orientadas ao folk retornam, mas nunca gratuitamente.

Cada faixa reserva uma surpresa, como o instrumento (que vou manter em segredo para não estragar a surpresa) que aparece na metade da quinta faixa, "Myr", e na minha faixa preferida, "Helvetesmakt", que progride de riffs que poderiam ter saído de alguma música do Darkthrone até um clímax quase transcendente, com várias camadas de vozes (segue link desta mais abaixo).

"Noregs Vaapen" é o visível ponto central de uma nova trilogia tramada por Hoest, afinal, deixa brechas suficientes para qualquer uma das direções supostas, mas o faz sem abrir mão da própria integridade da banda, que mesmo sem experimentações extremas, vai sempre parecer pra mim como uma das bandas de black metal com o espírito mais livre. Ouça-o depois do anterior, “Taake”, de 2008, para entender melhor.

Helvetesmakt: http://www.youtube.com/watch?v=354M8gQ0_NI

Meu top 5 Taake:

1 - Hordalands Doedskvad
2 - Noregs Vaapen
3 - Over Bjoergvin Graater Himmerik
4 - Nattestid Ser Porten Vid
5 – Taake

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Punx (Guizado, 2008)


Imagine a cena: um belo dia de sol, um lindo céu azul & você deitado no sofá da sala num tédio infinito, olhando pro teto e ouvindo o barulho da cidade que acontece lá fora. Adicione à mistura uma pequena porção de tarefas cotidianas do jovem estudante que mora só e uma dose generosa da procrastinação nossa de cada dia.

Num dia parecido com esse - mas com menos glamour do que a escrita faz parecer que ele teve - a personagem da cena era eu, e eu procurava por alguma coisa que pudesse preencher o meu vazio existencial do dia (ou que me ajudasse a ter um bom motivo pra continuar deixando tudo pra resolver depois, o que viesse primeiro). Numa pesquisa despretensiosa e sem muito critério, ou com critérios um tanto duvidosos – “que foto maneira, olha só, deve ser bom o som deles” ou “que nome genial o desta banda, bah” -, eu cheguei à página do Guizado no Last.fm.

Confesso que, mesmo achando o texto sobre ele genial (sim, eu leio os textos de lá sobre os artistas {ok, nem todos}), não pesquisei mais muita coisa. Falha minha? Deveria ter pesquisado mais? Não sei. Só sei que de uns tempos pra cá o que eu menos gosto de fazer quando vou conhecer uma música/um álbum/um artista/uma banda é ler muito a respeito - e aí eu dou um tapa na própria mão por estar escrevendo justamente sobre música -, até porque acho que a maravilha da vida conectada à internerdz é que tu podes ter acesso a qualquer coisa e ir selecionando os conteúdos que te atraem e os que tu queres passar longe. Enfim.

Coloquei o disquinho pra baixar e criei coragem pra fazer as atividades que a vida me impôs praquele dia, já abrindo espaço entre os goles de café da noite para este “Punx”, ansiosa para saber se tinha caído numa cilada musical ou se o bagulho era dos bons mesmo.

A decisão de escutá-lo à noite foi mais do que acertada: a marotice deste álbum PERTENCE às estrelas. Confesso que o lance de não ter vocais me deixou inicialmente meio nervosa, mas ao longo já da primeira faixa, “Vermelho”, a gente descobre que o bonito deste disco é que ele fala muito sem precisar verbalizar nada.

A sensação que eu tive foi a de estar num longo passeio noturno pelas ruas de uma grande cidade – as luzes, os carros, o silêncio dos edifícios comerciais, a TV ligada no 503 do prédio da esquina, os bêbados, os maus-elementos, os operários acordando pra pegar o metrô, as prostitutas, cansadas, se insinuando já sem muita vontade, e eu (ou você), com os fones de ouvido, percebendo o quão sufocante pode ser viver nesta “solidão coletiva”, indo e vindo sem saber exatamente para onde ou o porquê, mas apenas seguindo porque, em algum momento, alguém disse que tem que ser assim. São onze faixas que parecem completamente embebidas em poluição e fumaça das fábricas e eletricidade e tudoçascoisaí que a vida apresenta pra gente diariamente nestes pós-modernos anos dois mil e tantos, e todas elas sugerem movimento, um caminhar sem necessariamente precisar de uma direção certa, uma redescoberta do mundo externo diretamente ligada ao mundo interno, pessoal e intransferível de cada um. A paisagem cimentada surge na tua mente já no início e te acompanha até o minuto final, bem como a sensação de que é sempre noite, no sentido mais...desprotegido(?) que a palavra pode te proporcionar.

Mas ei, “Punx” não bebe apenas nas fontes da melancolia insone. O curioso, para mim, é que ele soa como se um amigo muito próximo sentasse conosco para contar sobre seus medos, dores e angústias, mas também sobre as delícias de se viver tão só e poder observar tudo o que acontece ao seu redor de tão perto, mas de tão longe, por mais clichê que isso possa parecer – e o mais bacaninha é que o trabalho do moço não soa como um momento de revolta de um membro do proletariado, nem como um playboyzinho qualquer que flerta com o gueto e se acha um cara sinistro. “Punx” me parece um convite aos pensamentos e sensações de um jovem que se sente só mesmo estando entre muitos, que vê beleza no fluxo rotineiro das coisas, mas que prefere observar a ser parte daquilo tudo, que passeia por todos os campos, mas ainda não encontrou sua casa.

Eu poderia falar que o disco tem forte a presença da música eletrônica, ou sobre as influências do hip hop ou duns batuques afros quase visíveis, ou do sopro jazzístico que as faixas exibem, porque está tudo ali, num recorte e colagem original e sincero que não desmerece nenhuma das influências citadas - mas eu realmente não penso que seja este o ponto, coleguinhas. "Punx" é, acima de tudo, um disco de sensações e incertezas. Guilherme Mendonça, o Guizado, cede um pouco das suas divagações noturnas e te proporciona uma viagem pra dentro das tuas próprias dúvidas e fraquezas, e é nisso que eu acredito que se pode encontrar a sua preciosidade enquanto obra musical. Um disco pra se ouvir só, de olhos fechados e à luz da lua.

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